sábado, 20 de abril de 2013

MULHERES DE CAMOCIM - DONA GUIOMAR E A MILITANCIA COMUNISTA

Quando eu estava pesquisando sobre a militância comunista em Camocim, Dona Guiomar Cordeiro de Oliveira, foi uma das minhas entrevistadas. Filha de Pedro Rufino, irmã do Seu Nilo, relembrou os tempos de tortura e sacrifícios. Quase tudo que ela me disse está reproduzido em entrevista concedida por ela no Portal Vermelho que reproduzimos abaixo. No momento em que o país tenta viabilizar uma Comissão da Verdade no sentido de investigar essa página triste da história brasileira, depoimentos como o da Dona Guiomar são reveladores. Leiam!
Dona Guiomar Cordeiro de Oliveira. Fonte: vermelho.org.br
Guiomar Cordeiro: “Meu pai deu a vida ao Partido Comunista”
Por Carolina Campos
Passo firme, sorriso ABERTO e muita história pra contar. Aos 87 anos, Guiomar Cordeiro de Oliveira recebeu o Vermelho/CE para falar da sua história de luta, da atuação comunista e de seu grande exemplo: o pai. Pedro Teixeira de Oliveira, conhecido como Pedro Rufino, foi um dos fundadores do Partido Comunista do Brasil, em Camocim, e é até hoje um dos maiores símbolos comunistas cearenses.
Única filha mulher de Pedro Rufino, Dona Guiomar tem da infância lembranças da companhia do pai nas passeatas, comícios e reuniões que ele participava. “Eu era pequena, não entendia muito, mas sempre o acompanhava”. Mas as recordações também são dolorosas. “Ele foi preso onze vezes, apenas por ser comunista e lutar pelo direito dos trabalhadores e do povo da região.
Muitas vezes ia deixar a comida dele na prisão, ficava na delegacia fazendo companhia e quando voltava, chorava de saudade”, relembra. Na escola, quando ouvia brincadeira dos colegas por conta das prisões, a resposta tinha na ponta da língua. “Ele não é ladrão. Foi preso porque defende os direitos dos pais de vocês”.
Não foram poucas as vezes que Dona Guiomar presenciou a prisão do pai. “Ele era comerciante, tinha um bar e atendia a clientela noite adentro. Uma vez, tarde da noite, ao chamar minha mãe para abrir a porta, foi surpreendido pela polícia que já o aguardava de tocaia. Não pode nem entrar para pegar roupas”, recorda.
Pedro Rufino filiou-se ao Partido Comunista do Brasil em 1928, ano em que fundou o Partido em Camocim. Liderança destacada, sempre lutou pelos direitos dos trabalhadores e das pessoas da região. “Meu pai nunca foi empregado de ninguém, então colocou um comércio. Ele não aguentava abuso de patrão e por isso defendia tanto os trabalhadores”, ratifica Dona Guiomar.
Foram inúmeras as participações de Pedro Rufino que marcaram o movimento popular em Camocim. “Onde ele chegava, era logo cercado. Meu pai era muito querido por todos. Mercado, estação de trem, construção civil, todo mundo recorria a ele quando precisava de alguma coisa”.
Dona Guiomar cita um incêndio que aconteceu numa localidade próxima e Pedro Rufino saiu em defesa da vítima. “Ele veio a Fortaleza, falar pessoalmente com o Governador, para garantir o ressarcimento dos bens”.
Nas passeatas do 1º de Maio e na greve geral de 1949, ele também era destaque. “Outra data de muito discurso e festa era o dia 3 de janeiro, dia em que comemorávamos o aniversário de Luis Carlos Prestes. O dia já amanhecia com foguetório na cidade”, sorri ao relembrar. A luta pela manutenção da estrada de ferro foi outra bandeira encabeçada por Pedro Rufino. “Foram meses se dedicando a esta causa.
Dia e noite, ele estava atuando, mobilizando as pessoas para garantir que a estrada de ferro não fosse retirada de Camocim. Teve até a visita de ministro na cidade e conseguimos adiar por quase 30 anos esta decisão. Saímos vitoriosos”, comemora Dona Guiomar.

Companheira de lutas do pai
Já mocinha, Dona Guiomar além de acompanhar Pedro Rufino nas atividades, também passou a participar dos debates. “Gostava de conversar com ele porque sei que o que dizia era o certo. Eu fazia até discursos nos comícios, sempre seguindo o mesmo caminho do meu pai”.
Dona Guiomar casou bem jovem, aos 15 anos. Por um tempo morou em Parnaíba (PI), mas sempre com vínculos em Camocim. Após oito anos, volta para a cidade natal e começa a atuar na defesa dos direitos das mulheres. “Fui presidente da União Feminina de Camocim. Realizávamos reuniões aos domingos para discutir as necessidades das mulheres da região. Nossa sede era bem movimentada e a participação empolgava. Muitas vezes vim a Fortaleza para representar a entidade nos encontros da capital”. Dentre as demandas, leite para as crianças carentes e melhoria das escolas. “A gente também se integrou na campanha ‘O Petroleo é nosso’. Saíamos para colher assinaturas”, relembra.
Dona Guiomar já tinha os quatro filhos quando Pedro Rufino foi eleito vereador, em 1948. Apesar de comunista, foi pelo Partido Republicano que conseguiu concluir o mandato, sigla que abrigou os comunistas no Ceará depois de o Partido Comunista entrar na ilegalidade.
A atuação de Pedro Rufino na Câmara Municipal de Camocim foi marcada por posições firmes e muita polêmica, principalmente por ir de encontro aos interesses das famílias tradicionais da política local. Como parlamentar fez parte das Comissões de Legislação, Educação e Cultura, Comissão de Saúde Pública e Assistência Social e Comissão de Redação. “Ele contribuiu na redação do regimento da Câmara de Camocim que está em vigor até hoje”, ratifica Dona Guiomar, orgulhosa.
Um fato que hoje arranca sorrisos de Dona Guiomar era a conduta do Vereador Alfredo Coelho. “Ele faltava sessões e pedia licenças constantes porque não queria ter o desprazer de dividir o mesmo lugar com meu pai nem ser chamado de colega por um comunista”. Além de vereador, Pedro Rufino foi ainda Presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil de Camocim e de outras entidades e associações ligadas aos movimentos sociais da região. Ele faleceu em 18 de outubro de 1973, em decorrência de problemas cardíacos.
Filiada há mais de 50 anos ao Partido Comunista, Dona Guiomar continua com a convicção de defender as ideias de Pedro Rufino. “A lição que ele me deixou foi de fazer o bem, defender o povo e trabalhar muito em benefício da melhoria de vida das pessoas. Meu pai deu a vida ao Partido Comunista e em defesa de sua causa e nada era mais importante para ele que as ações do Partido”.
Uma das pioneiras na luta em defesa dos direitos da mulher, Dona Guiomar comemora o fato de uma mulher ter sido eleita Presidente do Brasil pela primeira vez. “Ela é corajosa e muito inteirada das coisas. Torço que continue nossa luta e faça um grande governo, com democracia e sem corrupção. Eu estou do lado dela”, ratifica.
Liderança destacada e referência comunista no Ceará, Pedro Rufino foi responsável pelo fortalecimento do Partido no Estado. Atualmente, o PCdoB elegeu um Senador (Inácio Arruda), dois Deputados Federais (Chico Lopes e João Ananias), um Deputado Estadual (Lula Morais), além de administrar várias prefeituras cearenses. Questionada sobre o que o pai acharia deste crescimento, Dona Guiomar é enfática: “Ele estaria muito feliz e batalhando para o Partido crescer ainda mais. Quem sabe até ele mesmo chegar a estes cargos”.
Apesar da idade avançada, Dona Guiomar ainda acompanha reuniões do Partido e participa de eventos, como na solenidade em comemoração aos 90 anos de fundação do PCdoB, momento em que a atuação de Pedro Rufino foi destacada como um dos comunistas pioneiros no Ceará. “Até quando puder, vou continuar a luta de meu pai, na defesa dos trabalhadores, das mulheres e dos direitos do povo”.
Com atuação voltada para a juventude e para as mulheres, Dona Guiomar deixa um recado para os comunistas enfatizando a necessidade de o povo se organizar e da união de todos. “É aquele velho ditado: uma andorinha só não faz verão. Devemos atuar com união e organização, trabalhando pela defesa dos direitos das pessoas e sempre com um olhar voltado para o futuro”, defende.

Fonte: Portal Vermelho. 10/04/2012.

Um comentário:

  1. Isso mesmo. "Passo firme, sorriso ABERTO", justo este que se ver na foto e como está na descrição. Homenagem merecida! É uma mulher de fibra. Admiro esta mulher, não por ser parente, o que de certa forma nos aproxima, sendo prima materna de minha mãe. Mas por sua história de vida. Hoje, morando em Fortaleza, vem a Camocim quase que mensalmente e sempre muito alegre visita a pé todos os parentes vendo como estão e dando uma palavra amiga. Uma atitude louvável!

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