Janeiro está findando! E com ele imagino que a tradição do Reisado em Camocim está se perdendo com Dona Maria do Campo. No final dos anos 1990 a vi ainda com dois ou três abnegados tentando manter viva este folguedo de origem portuguesa. Quando conversei com ela na época, tive a certeza da falta de uma política pública para nossa cidade. Naquele momento. uma verba mínima para ajudar o grupo era tão irrisória, que me furto a declinar a quantia. Isso me traz à mente o quanto este povo é criativo e festeiro, relatando algo sobre uma manifestação artística de outrora, feita por gente simples, pelos trabalhadores do mar e da terra. Trata-se da Nau Catarineta de Camocim ou Marujada.
Capitão põe piloto em liberdade
Meu bom piloto se for livre já está
Meu bom piloto se for livre já está
Hoje é dia de festejo não costumo castigá.
Hoje é dia de festejo não costumo castigá.
(Nau Catarineta de Camocim. Mestre: Sebastião Marques. In: SERAINE, FLORIVA. Folclore brasileiro. Ceará. Rio de Janeiro: MEC/Funarte. 1978, p.73)
Um exemplo de como os trabalhadores são capazes de realizar seu próprio lazer, mediado pelas apropriações que fazem do que vêem em outros lugares ou do que chega até eles, é a Nau Catarineta de Camocim, registrada em obra sobre o folclore brasileiro.
Com uma miniatura de barca, os trabalhadores deixam as sedes e ganham as ruas representando seu cotidiano repleto das experiências e das relações vividas no interior dos navios. A festa da Nau Catarineta, portanto, expressa uma tradição que se transforma em cada porto, a ponto de existirem várias versões do folguedo por todo o país. É, portanto, no cotidiano do navio que essas manifestações nascem, posto que, como disse um estudioso, “é evidente que ele se tornou um local de encontros, onde se apinhavam várias tradições, numa estufa de internacionalismo de extraordinário vigor”.
Camocim teve a sua versão de Nau Catarineta. Segundo algumas informações, o folguedo era uma espécie de auto representado por personagens inspirados na tripulação de um navio, com cerca de trinta ou quarenta pessoas uniformizadas a caráter dançando ao som de música e versos ritmados, preservados na quadrinha em epígrafe no início deste tópico, e nas fugidias lembranças de velhos marinheiros, como o Sr. Euclides Negreiros, que foi testemunha das apresentações do folguedo:
"No Parazinho, por exemplo, nos dias de festa, Dia de São Pedro, eles levavam a Barca de São Pedro e quem conduzia (...) era o Cacau, o Cacau se fardava todo de branco, o meu irmão Valdemar e o mestre do rebocador eram os homens que conduziam a barca de São Pedro. Esta barca eu acho que nãoexiste mais..."
No final dos anos 1940, o estivador Sebastião Marques (o Sebastião Perna Grossa) organizava este folguedo e animava vários pontos da cidade. Infelizmente, não restou muito dessa festa, a não ser o registro na obra já referida e algumas parcas lembranças de depoentes que não ajudaram muito a reconstituir o sentido e a beleza da mesma. Talvez contemporaneamente, o fato de se levar ainda a imagem de São Pedro dentro de uma miniatura de canoa compondo o andor na procissão marítima seja uma reminiscência da Nau Catarineta de antigamente.
Foto: icebrasil.org.br
(Sobre outras manifestações dos trabalhadores camocinenses no campo da cultura, acesse o texto: "Os trabalhadores em festa..." na lateral do blog)
Quando menina, ouvia meu pai cantar uma das
ResponderExcluirdas versões de A Nau Catarineta. Vou fazer uma
postagem, sobre o assunto e, ao pesquisar, no google, cai no seu excelente blog, Carlos Augusto.
Vou seguí-lo, portanto, voltarei...
Um abraço
Lúcia