sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DE CAMOCIM. PATRIMÔNIO CULTURAL DO ESTADO DO CEARÁ



Estação Ferroviária de Camocim. 1989. Arquivo: Valdete Fonseca Vieira.


Desde o fechamento do ramal ferroviário Sobral-Camocim  em 1977 que a Estação Ferroviária começou a sofrer um processo de deterioração predial e ocupação das dependências por sem-tetos, usuários de drogas e ponto de prostituição.

Mais de uma década depois, na administração municipal de Murilo Rocha Aguiar Filho - Murilinho (1989-1992), juntamente com outras entidades e pessoas iniciou-se um movimento para a recuperação do prédio símbolo que marcou a nossa história desde as últimas décadas do século XIX até meados do século XX. Deste modo, aproveitando-se uma  visita do então governador do Estado do Ceará, Tasso Ribeiro Jereissati, a população se mobilizou e lotou a Praça da Estação com faixas e cartazes, pedindo a revitalização daquele espaço.

A reforma foi feita e a então Estação Ferroviária passou a ser a Casa da Cultura, além de sediar o SEBRAE e no pátio externo acontecia a "Quinta Cultural", onde feiras e shows de cantores e humoristas aconteceram por um bom tempo.

Estação Ferroviária de Camocim. 2022. Foto: Carlos Augusto P. dos Santos.


No início dos anos 1990, a Estação Ferroviária foi tombada como bem cultural do Estado do Ceará pelo  COEPA – Conselho Estadual de Preservação do Patrimônio Cultural do Estado do Ceará, sob o número 028, em cuja descrição dizia:

Estação Ferroviária de Camocim, localizada na extremidade leste da cidade à margem esquerda do rio Coreaú, foi construída para ser ponto inicial que interligaria o Porto de Camocim à estrada de Sobral.
Construída com traços arquitetônicos que apresentam a influencia marcante exercida pelas edificações ferroviárias europeias no Brasil durante o século XIX, com feições neoclássicas, planta de desenho simétrico e construída em alvenaria portante, a Estação Central de Camocim foi inaugurada em 1881.
Esta edificação nos reporta à época em que o sistema ferroviário despontava como o meio de transporte mais eficiente e hegemônico no Estado, levando e trazendo pessoas e mercadorias, cruzando o Ceará, redefinindo espacialmente a feição das localidades em que se inseria, impulsionando a economia e modificando os modos de pensar e agir da sociedade.

Portanto, a Estação Ferroviária é o nosso único bem tombado por uma lei. De lá para cá, já foi sede da Prefeitura Municipal e hoje abriga a Secretaria da Educação de Camocim. Não importa o uso, desde que se preserve a história e a memória dos lugares.

segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

LIVRO "HISTÓRIA POLÍTICA DE CAMOCIM. 1898-1987. Vol. 1"





No último dia 21 de dezembro de 2022, por ocasião da Sessão Solene da Câmara Municipal de Camocim que agraciou várias pessoas com o título honorífico de Cidadão Camocinense, evento que ocorreu na Escola Profissionalizante, lançamos o livro "História Política de Camocim. 1898-1987". vol. 1, publicado pela Editora Sertão Cult. Trata-se da 14ª obra de nossa autoria sobre o município e que inaugura uma série sobre o cotidiano político local.

Agradecemos a todos que contribuíram para a escrita deste livro que durou dois anos, especialmente à Câmara Municipal, a ANPUH -CE, ao Prof. Airton de Farias pelo prefácio da obra e ao Prof. Gilson Cordeiro , pela apresentação do livro no evento, da qual reproduzimos um trecho abaixo:



O Prof Carlos Augusto, professor adjunto da Universidade Estadual Vale do Acaraú - UVA, vem desenvolvendo significativos estudos nas areas de memória, história oral, cotidiano, trabalho e outros. Tem uma vasta bibliografia de trabalhos publicados desde organizações de livro, livros solo e trabalhos belíssimos de orientação. Dentre estas obras, destacamos livros de natureza didática que lançam um olhar aguçado para a juventude da cidade, uma brilhante ação de resistência e memória local.

Destacamos hoje a obra História Politica de Camocim, considerando mais 100 anos de política local registrados, catalogados com personagens que contribuíram para o colorido espaço de fazeres sociais neste espaco de tempo.Mais que uma galeria de ilustres, com datas e feitos romanescos, o professor Carlos nos presenteia com uma percepção crítica da vida social da cidade,  de pormenores cotidianos a complexas conjunturas politicas locais que dialogam para o entendimento do cenário politico brasileiro do século XIX e XX, trazendo-nos pistas do que somos e por que somos.

Enfim, tenho a honra de dizer que se trata de uma obra para leitura de especialistas em história, antropologia até jovens vestibulandos e todos que procuram compreender o espaço onde vivem".

O livro está disponível para download no site da Prefeitura Municipal de Camocim, na aba "História Camocinense".

sábado, 3 de dezembro de 2022

ESTAÇÃO FERROVIÁRIA DE CAMOCIM. NOSSO ÚNICO BEM TOMBADO PELO PATRIMÔNIO ESTADUAL

 Num momento em que a questão patrimonial começa a ser discutida em nossa cidade, seja pelo processo acelerado de destruição de prédios históricos, seja pelas poucas tentativas de se adotar uma política pública de preservação e conservação do patrimônio cultural, reproduzo aqui um "lugar de memória" dos camocinenses, erguido ainda no século XIX. O artigo foi publicado no site do Laboratório de Estudos dos Mundos do Trabalho (LEHMT/UFRJ), dia 30/11/2022.

LMT #118: Estação Ferroviária de Camocim (CE) – Carlos Augusto Pereira dos Santos


Carlos Augusto Pereira dos Santos
              Professor do Curso de História da Universidade Estadual Vale do Acaraú


Menino da Rua do Egito em Camocim, filho de maquinista,
morando à beira da linha, eu terminei ficando com o trem no
sangue, como diz Rachel de Queiroz.

(Pe. Luís Ximenes, em Paixão Ferroviária, 1984)

AEstrada de Ferro de Sobral, no Ceará, funcionou por quase um século.  Quando da seca de 1877, o Governo Imperial autorizou a análise da viabilidade da ferrovia, no sentido de socorrer os flagelados com postos de trabalho e minimizar a fome que assolava o território cearense. Além disso, a construção da ferrovia seria uma forma de ligar os sertões do norte da província ao porto de Camocim, considerado o de melhor navegabilidade no estado. Os estudos para a construção da estrada de ferro tiveram início em 1878. No ano seguinte, a 26 de março de 1879, realizou-se com solenidade de estilo, o assentamento do primeiro trilho da estrada de ferro em Camocim. Neste mesmo ano, Camocim passou à condição de município se emancipando de Granja. A inauguração do primeiro trecho da Estrada de Ferro de Sobral, entre Camocim e Granja, numa extensão de 24,5 quilômetros, ocorreu no dia 15 de janeiro de 1881, dois anos após o início dos trabalhos.

Construída para ser o ponto inicial que interligava o Porto de Camocim à Sobral, a estação ferroviária apresenta traços da influência europeia no Brasil no que diz respeito às edificações ferroviárias erguidas durante o século XIX. Como se disse anteriormente, a chegada da ferrovia provocou imediatamente a mudança de status administrativo de Camocim alavancando as transações comerciais que já se faziam pelo porto, escoando a produção agropecuária do noroeste cearense. Em pouco tempo, estas atividades demandaram a chegada na cidade da Alfândega, do Banco do Brasil, dos Correios, entre outras repartições públicas e privadas.

A ferrovia para Camocim e região promoveu não somente a economia regional, mas, um interessante espaço para se compreender o mundo do trabalho naquela época. O complexo ferroviário, no auge de suas atividades, chegou a ter em média 800 trabalhadores entre a administração e o pessoal alocado nas oficinas de manutenção de trens. Estas oficinas foram importantes para a formação de várias categorias profissionais como mecânicos, torneiros, carpinteiros, ferreiros, dentre outras. A maioria destes trabalhadores era de Camocim e da região noroeste do estado. Grande parte dos ferroviários se estabeleceram em ruas próximas da estação e os funcionários mais graduados, como os engenheiros e agentes de estação, tinham moradia dentro do pátio de manobras de trens ainda hoje preservadas e habitadas por descendentes destes.


A presença de uma massa de trabalhadores na ferrovia e no porto acabou por despertar as ideologias políticas da época.


Com efeito, a cidade de Camocim foi a primeira do interior cearense a organizar uma célula comunista em 1928 e por conta de seu histórico de lutas na própria ferrovia, acabou por obter o epíteto de “Cidade Vermelha” na imprensa comunista. Por outro lado, o integralismo, embora em menor número, esteve presente entre os trabalhadores ferroviários no contexto da polarização ideológica dos anos 1930.

Um exemplo dessa militância pode ser observado no episódio que ficou conhecido como “A Rebelião da Ferrovia”. Entre novembro de 1949 e janeiro de 1950 uma greve de ferroviários tomou conta da cidade em um protesto contra o fechamento das oficinas de manutenção e a tentativa de transferir funcionários da ferrovia para outros locais. A greve ganhou ares de revolta popular, envolvendo várias categorias e lideranças sindicais. O leito da ferrovia foi interditado pela população com paus, pedras e caldeiras velhas evitando assim a saída dos trens. A tensão durante a rebelião foi muito intensa, a ponto de ser instalada uma espécie de sirene na Estação Ferroviária que era acionada para chamar os manifestantes a qualquer hora do dia quando se percebia algum movimento da direção da ferrovia em desobstruir a via férrea. As mulheres, muitas delas organizadas pela União Feminina Camocinense ligada ao Partido Comunista, tiveram uma participação particularmente significativa na greve e na rebelião popular.

Apenas a vinda de um representante do Ministro de Obras e Viação e do próprio Governador do Estado acalmou os ânimos. Em um grande comício, essas autoridades terminaram por atender ao clamor popular e as oficinas e os funcionários foram mantidos na cidade.

No entanto, o processo de desmonte do ramal ferroviário Camocim a Sobral se acelerou a partir de 1950. Os funcionários foram sendo paulatinamente transferidos para outras estações e praticamente não houve substituição do material rodante neste período até o fechamento do ramal.

Em 24 de agosto de 1977, o último trem partiu de Camocim rumo à Sobral, pondo fim a 96 anos de serviços prestados pela ferrovia à população da então zona norte do Ceará, e de muitas histórias do mundo do trabalho e dos trabalhadores da “estrada”.  Hoje, tombada pelo patrimônio público estadual, a estação ferroviária sedia a Secretaria da Educação Municipal.

Ferroviários em greve e população obstruem a ferrovia. Camocim.  Fonte: Arquivo particular da Sra. Elda Aguiar.

Para saber mais:

  • CARVALHO, Cid Vasconcelos deO Trem em Camocim: Modernização e Memória. 2001. Dissertação (Mestrado em Programa de Pós-Graduação em Sociologia) – Universidade Federal do Ceará.
  • OLIVEIRA, André Frota de. A Estrada de Ferro de Sobral. Fortaleza: Expressão Gráfica e Editora, 1994.
  • SANTOS, Carlos Augusto Pereira dos. Entre o porto e a estação. Cotidiano e cultura dos trabalhadores urbanos de Camocim-CE. 1920-1970. Fortaleza: INESP, 2014.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

PATRIMÔNIO PRESERVADO. VILLA HOSTERINDA. 1931

 

Villa Hosterinda. 1931. Camocim-CE. Foto: Carlos Augusto. 31/11/2022.


    Enquanto as ações predatórias do patrimônio edificado continuam a todo vapor na Rua 24 de Maio em Camocim-CE, ressaltamos o movimento contrário, isto é, a preservação consciente de proprietários de imóveis centenários nesta mesma rua.
    Na postagem de hoje,  destacamos a casa denominada "Villa Hosterinda" construída em 1931, data estampada no alto do seu frontispício. Além de ser um costume antigo de trazer a data da construção das casas de então, a reforma e a pintura nos meses finais do ano também é outro costume cultuado pelos proprietários mais velhos.
    Parabenizamos a família Coutinho por preservar há mais de 90 anos este bem que se constitui num belo exemplar da arquitetura eclética que embeleza nossa cidade.